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DISTÚRBIOS PAROXISTICOS NÃO EPILÉPTICOS - perda de fôlego

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DISTÚRBIOS PAROXISTICOS NÃO EPILÉPTICOS

Termos – perda de fôlego, sincope, breath holding, breath holding spells, syncope.

Drª Kellen Ribeiro Silva, neurologista infantil, Hospital Estadual Bauru.

 

A palavra paroxismo refere-se a um evento clínico caracterizado por manifestações intensas, súbitas, com início e fim determinados que podem corresponder a alterações súbitas de diversos setores do organismo, em geral, causando disfunções ou hiper-funções de um órgão ou sistema. É importante frisar que a crise epiléptica é uma manifestação paroxística decorrente de descarga neuronal intensa, hipersíncrona em uma região definida do córtex cerebral (crise focal ou parcial), ou envolvendo o córtex como um todo (crise generalizada).

Irei descrever neste texto apenas os  distúrbios  paroxísticos NÃO epilépticos como a síncope e a perda de fôlego, que considero as duas principais entidades que geram confusão diagnóstica na prática clinica em especial no consultório do pediatra.

Pretendo esclarecer os principais pontos para diagnóstico e a fisiopatologia além do tratamento e exames necessários, pois  perda súbita de  fôlego ou consciência, mudança súbita de comportamento ou  sensações estranhas subjetivas não são necessariamente epilepsia 3.

Nos casos de perda transitória e repentina da consciência e os ‘ataques’ não epilépticos são devidos a um dos distúrbios  abaixo 3:

Uma insuficiência circulatória levando  a uma  isquemia cerebral  aguda

Mudanças repentinas na  homeostase (eletrólitos) sanguínea

Distúrbios  relacionados a narcolepsia/cataplexia

Alterações psicogênicas

 

As condições paroxísticas não epilépticas são de variadas origens, podendo compreender etiopatogenias diferentes como  exemplificado na tabela A 1, 3

Tabela A -Manifestações que podem ser confundidas com epilepsias em crianças e adolescentes – incluindo seus mecanismos.

a) OXIGENAÇÃO CEREBRAL DIMINUIDA (

Perdas de fôlego (tipos cianótico e pálido)

Síncopes

Manobras de valsalva

Hipertensão pulmonar /  tromboemolismo pulmonar

Migranea  - da artéria basilar

Outras alterações – sindrome do sinus carotideo, hipotensão postural

 

b) HIPGLICEMIA E HIPOCALCEMIA

 

c) FENÔMENOS SONO RELACIONADOS

Terror noturno / pesadelos

Sonambulismo, sonilóquio, bruxismo

Apnéias do sono

Distonia paroxística, mioclonias noturnas benignas infantis

Enurese

Narcolepsia

 

d)DISTÚRBIOS DE MOVIMENTO

Mioclonias benignas da infância, tiques

Vertigem paroxística  benigna, Spamus nutans

Torcicolo paroxístico

Coreoatetose paroxística , ataques de tremores, reações de susto

Apraxia ocular motora

 

e) COMPRESSÃO DE TRONCO CEREBRAL / doenças intracranianas

Seringomielia,

Impressão basilar

Sd. Arnold – Chiari

 

f) REFLUXO GASTROESOFÁGICO

g) FENÔMENOS PSICOLÓGICOS RELACIONADOS

Pseudo-epilepsia

Epilepsia fictícia

Síncope da hiperventilação

Síndrome do pânico

Masturbação

 

h) ASSOCIADA A DESORDENS CARDÍACAS

Arritimias /assistolia (blqueios de ramos), Ico

Doenças do arco aórtico , arterite de Takayasu

Tetralogia de Fallot

Estenose aortica

 

Lombroso & Cols 2 caracterizaram as perdas de fôlego por apnéia e perda de consciência, geralmente causadas por choro (devido a medos ou frustrações), dor ou pequenos traumas.

Lombroso & Cols 2 sugeriram combinações de fatores para explicar os episódios pálidos 2:

Choro intenso levando a isquemia cerebral hipocapnéia

Apnéia levando a hipoxemia

Espasmo respiratório (manobra de valsalva) levando  ao aumento da pressão intratorácica

 Rendimento cardíaco diminuído

Circulação cerebral debilitada secundária aos itens 1 e 4

 

Há uma diferença entre as crises cianóticas e as pálidas, pois nas crises pálidas raramente existe respiração forçada  e se manifestam  mais com rigidez ou opistótono, sendo comuns os tremores ao fim das crises 1. Não há  tratamento medicamentoso que realmente impeça a ocorrência das crises 1. Orienta-se a manobra de compressão da base do tórax, com o que a criança expele o ar e apoio psicológico aos pais 1.

“Não há motivo de se indicar EEG, sendo que há estudos mostrando sua normalidade interictal e, durante os episódios, há somente lentificação do traçado, sem anormalidades paroxísticas 1.”

SINCOPES

Sincope é definida como uma perda súbita e breve da consciência devido a um episódio discreto e generalizado de isquemia cerebral (insuficiência circulatória3).

Sincope é freqüentemente confundida com epilepsia, e recebe desnecessariamente tratamento com medicações anti-epilépticas e que, apesar de não trazer grandes malefícios, é ineficaz.  Contudo o maior problema é ignorar uma possível alteração cardíaca, a qual pode ser fatal no próximo evento5. O Tilt Test. pode ser ocasionalmente útil e necessário para auxiliar na identificação da etiologia da atividade ‘convulsiva’ quando a historia, mesmo quando bem explorada, ainda deixa dúvidas sobre a causa da perda de consciência. Não devemos  ainda esquecer que apenas uma pequena minoria dos  reflexos de síncope realmente significam uma patologia cardíaca e um risco de morte súbita5.

Outra causa de perda súbita de consciência de origem cardíaca é a síndrome do QT longo5.

A sincope vaso vagal é assim denominada devido o mecanismo de estimulação vagal ser predominante e em geral há um fator de gatilho bem determinado tais como: visualização de sangue ou punção venosa, dor por injurias ou pequenos traumas, receber noticias desagradáveis. Quando o ataque demora mais de 20 segundos ou se apresenta como uma sincope convulsiva (com movimentos clônicos) ocorre por causa de um transiente de assitolia indicando uma duração maior da insuficiência circulatória 3, 4.

Não há dúvidas que  os ataques de  sincopes com movimentos convulsivos não são relacionados a epilepsia 3, 4. A convulsão é apenas uma resposta a isquemia cerebral aguda3. Quando um problema cardíaco causa sincope  associada a esforço , o ataque necessariamente ocorre durante a realização da atividade física e resulta de  sincope vaso vagal5.

SINTOMAS QUE SUGEREM  ETIOLOGIA CARDIÁCA.

Sintomas prodrômicos ausentes

Evento precipitado por esforço

Evento tem como gatilho  uma emoção forte, susto ou barulho muito alto

Associação com palpitação ou dor no peito

Arritmia ou doença cardíaca já conhecida

Historia familiar para morte  súbita, cardiomiopatia, arritmia cardíaca, síndrome do QT longo

 

As sincopes benignas são deflagradas por problemas emocionais, visão de sangue, injeções, sensação de medo e visão de violência ou cenas de terror, são mais comuns na infância e adolescência  e nos sexo  feminino 1. Não há necessidade de tratamento ou  realização de EEG – basta uma anamnese bem feita para o diagnóstico correto1,5. Os exames complementares deverão fazer parte  da investigação apenas quando houver dúvidas sobre a etiologia ou houver outros sinais que façam pensar em alteração de origem cardio-vascular ou de alteração neurológica.

 

 

BIBLIOGRAFIA

1- Aron Diamente, Saul Cypel, Neurologia infantil, 3ª edição, Atheneu, pag 1000-1001

2- Lombroso CT, Lerman P. breath holding spells (cyanotic and palid infantile syncope) Pediatrics 39:563,1967.

3- Niedermeyer, Ernst; Silva ,Fernando Lopes ; Electroencephalography, Basic principles, clinical applications and related fields, 4ª Ed, Lippincott, cap 28, pag586-594.

4- Naquet, R., and Vigouroux,R. A. 1972. Acute cerebral anoxia and syncopal attacks. In Handbook of electroencephalography and Clinical Neurophysiology, vlo. 14ª. Ed., A. Remond, PP,68-71. Amsterdan: Elsevier

5 – Paula Brna, Peter Camfield, Carol Camfield, Mark Messenger, John Finley, When Are epsisodes of loss of consciousness life-threatening. Paediatr Child Health, Vol 11 nº 6, July/August 2006; pag 359-361.

Autor

Dra Kellen Ribeiro Silva

Dra Kellen Ribeiro Silva

Neurologia Pediátrica

Especialização em neuropediatria no(a) FMB - UNESP.